Frederico Luiz, Ciudad del Este
Escuto música e fico a imaginar... hoje à
noite num teatro ou numa igreja qualquer da imensa Rússia um coral canta as
VÉSPERAS Op. 37 de Sergei Rachmaninoff. Vésperas são as orações de fim de tarde
dos monges. No caso das Vésperas de Rachmaninoff, trata-se de música sacra composta
para a Missa da Vigília Pascal, isto é, a noite do Sábado de Aleluia.
Segundo o costume judeu, o dia acaba com
o pôr-do-sol, e não com o relógio da meia-noite. Assim, na noite do Sábado Santo
os cristãos celebram os primeiros instantes da ressurreição do Senhor, quando
os anjos mal haviam rolado a pedra da sepultura e Jesus ainda não subira para a
glória celeste. No Sábado, a glória da ressurreição ainda não estava completa.
Tudo se consumaria no Domingo.
Por que, em pleno século XX, Rachmaninoff escolheu o canto polifônico renascentista?
Escuto música e fico a imaginar... Talvez
porque quisesse dar a sensação de um acontecimento sublime, profundo, mas ainda
não definitivo. Pois quem já escutou, por exemplo, o famoso GLÓRIA de Vivaldi fica
na expectativa de alguma explosão que nunca se realiza nas VÉSPERAS de
Rachmaninoff, explosão de instrumentos que nunca chega a acontecer.
É como se a música ficasse em suspenso,
como no NOLI ME TANGERE de Fra Angelico (1387-1455).
“- Não me retenhas, Maria, porque ainda não subi ao Pai, mas vai dizer aos meus
irmãos que subirei ao Pai” (Jo 20, 17).
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